quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Educação: um antídoto à mera obediência

Por: Nathália Christine Mendonça Nery,
Sofia Holmes Carvalho e
Tamara Rodrigues Araújo

Constantemente nos questionamos por que as coisas tristes acontecem ou por que fazemos algo que possivelmente vamos nos arrepender. Se você está estudando e sente que está na hora de fazer um lanche, vai até a cozinha e se depara com um bolo de rolo saído do forno, o come mesmo sabendo que precisa manter a forma para se encaixar nos padrões de beleza estabelecidos pela sociedade. O sentimento de culpa surge com o arrependimento, e você geralmente é tomado pela ideia de que não há como se livrar desses desejos, tirando de si a responsabilidade do seu ato. Por outro lado, existem meios de livrar-se dos quilinhos a mais através de uma alimentação controlada aliada a prática de exercícios físicos regulares, solução essa que só depende de um maior domínio sobre seus desejos.
O exemplo acima origina duas vertentes de deliberação: a primeira, que tenta buscar ideias para explicar os acontecimentos a partir da tese de que não existe liberdade para decidirmos nossa própria conduta devido a uma força superior que a tudo manipula; e a segunda, que garante que somos responsáveis por nossa conduta e que podemos mudar o sentido dos fatos de acordo com nossas atitudes, sendo assim, uma necessidade moral.
Quando falamos de moral, estamos nos referindo ao conjunto de valores, de normas e de noções do que é certo ou errado, proibido e permitido que ditam as regras sociais de convivência, de forma que um ser moral é aquele que é capaz de seguir e se adequar as regras da sociedade. A grande questão é identificar se o importante é seguir as regras sem significá-la e apenas obedecê-la; ou se é possibilitar a liberdade de cada um de seguir o que se acha importante para a sociedade.
Trazendo esse contexto para o âmbito educacional, é possível observar que as escolas preconizam uma educação “desmoralizante”, pois ensinam mais a obediência do que a vivência em liberdade, originando a falsa ideia de que o cumprimento de regras é diretamente proporcional à responsabilidade. Esta, diferentemente de submissão, exige a consciência da norma obedecida, seus valores e sua posição como sujeitos de uma relação moral.
O dilema acima nos remete aos ideais pregados pelos filósofos Platão e Aristóteles, que em seus discursos tematizaram as principais questões éticas que perduram até os dias atuais. Agir com a reta-razão para o atingimento do bem é, segundo tais filósofos, uma ação politicamente virtuosa. Para Platão, o governo ideal é aquele em que o filósofo, por conhecer as coisas em sua essência, estabelece as leis, cabendo aos cidadãos apenas a obediência, uma vez que não possuem a habilidade desse conhecimento. A concepção de virtude, adormecida em cada uma das pessoas, seria a de obediência formal às normas, sendo estas necessariamente boas. No cenário escolar, é possível comparar tal pensamento ao cumprimento das regras propostas pela instituição, supostamente boas e corretas.
Por outro lado, Aristóteles defende que aquele que apenas obedece não age necessariamente de maneira moralmente relevante, exigindo-se dele a consciência do bem no agir moral. Para o filósofo, e ao contrário de Platão, a virtude resulta da prática, do exercício do bem de acordo com a reta-razão. Essa razão refere-se ao meio termo que podemos optar ao deliberar sobre algo, é a opção situada entre os extremos e que nos dirige às virtudes.
Ao pensar a questão das normas, é possível refletir: será que é tão merecedor de prêmios aquele que obedece a uma lei sem sequer ter a mínima noção do que significa sua obediência? Para Platão sim, pois apenas os filósofos, uns poucos dentre os cidadãos da polis, poderiam de fato ter consciência dos valores e consequências de seus atos. Já Aristóteles responderia não, pois acreditava que todo homem é dotado de razão e, por isso, capaz de compreender suas ações e escolhas.
A educação para a moral, que nos exige também viver a liberdade e as angústias trazidas por esta, não se satisfaz com a simples obediência, sem saber dos porquês e das consequências. Não basta apenas indicar o certo e o errado, mas instigar a tomada de consciência por parte dos alunos, através da liberdade moral que, por sua vez, implica vivenciar essa livre escolha. Em um exemplo grosseiro, podemos comparar com andar de bicicleta: por mais que existam instruções, o aprendizado se efetiva com a prática e com a experiência das quedas e dos movimentos falhos até alcançarmos o equilíbrio.
Educar para a moral, nesse sentido, exige um projeto e atitudes que extrapolem a sala de aula, como a experiência do exercício da liberdade em que o aluno é tratado com respeito e confiança, mas a ele também são dadas responsabilidades. O papel da instituição, além de garantir essa liberdade, seria o de valorizar esse processo de demonstração de consciência dos valores morais envolvidos nas atitudes praticadas pelo aluno e pelos outros.
Conhecer as regras e valores da sociedade à qual pertence faz parte desse processo de conscientização, mas ainda é preciso levar em conta o aspecto social envolvido. Como campo dinâmico, a ética não se constitui de um livro com as verdades do bem e do mal, mas em constante mudança em todo e qualquer grupo social. Compreender esse movimento de construção e desconstrução nos torna hábeis a reconhecer que não apenas os professores e demais responsáveis pelas instituições de ensino sejam educadores do comportamento moral, mas todo indivíduo que componha o espaço social.

Referências
- BARROS FILHO, Clóvis de et al, Os limites do fatalismo. Coleção ética: pensar a vida e viver o pensamento, São Paulo: Duetto Editorial, v.3, p. 16-21, março/abril. 2011.
- MARCONDES, Danilo. Textos básicos de ética: de Platão a Foucault. 5 Ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.

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