por Alina Coriolano e Phagner Ramos
A: Teólogo, filósofo, padre dominicano, um dos
principais representantes da escolástica, pai do tomismo e santo declarado pelo
papa João XXII. Ufa! Acho que acabei.... Com grande honra, temos o prazer de
receber para um bate-papo: Tomás de Aquino! Obrigada por estar conosco esta
tarde, Tom!
Tom: Obrigado pelo convite, garotos! É um prazer estar
aqui ainda mais por passar certo tempo afastado desde... Bom, desde a minha
morte, mas estou feliz por voltar ainda que temporariamente.
P:O prazer é todo nosso! Bom, vamos começar! Digamos
Tomás, que essa é uma pergunta bem antiga minha desde a época em que fui
apresentado ao cristianismo e, desculpe-me se for óbvio, mas porque Deus criou
o mal?
Tom: Antes, gostaria de lhe parabenizar! Pelo visto, sempre
fostes bem indagador. Lembra-me um colega, Agostinho, que 800 anos antes de mim
indagou-se sobre a mesma coisa. E vamos dar mérito a ele: suas reflexões
sistematizaram o pensamento cristão durante muitos séculos. E é importante
destacarmos uma coisa: Deus não criou o mal. Na verdade, Ele criou um anjo de
luz, o mais belo de todos, e o anjo se tornou a representação do mal. Para mim,
o que aconteceu com Lúcifer é a metáfora da falha, ou seja, ele se torna mal
por uma falha, não pela criação. Permita-me aqui também esclarecer que o Mal
não é um ente, não é um ser que vive. Não consigo pensar em um ser nascido para
o mal já que todos nós somos frutos do supremo amor e do supremo bem.
Figura 1Quadro
de MihályZichy, "Lúcifer". Mostra a expulsão de Lúcifer do Céu por
Deus
A: O senhor mencionou um ponto importante: uma pergunta
milenar e de grande importância. Atualmente, como em quase todas as eras da
humanidade, há sempre o questionamento: por que existe tanta maldade no mundo? As
doenças, a morte, as guerras; enfim, acontece tanta coisa ruim nesse mundo, e
muita gente se pergunta onde está Deus! E já que o senhor defende que não há um
ser a quem possamos culpar, vem a grande questão: ou Deus não pode acabar com o
mal ou Ele não quer. Se for a primeira opção, Ele não é onipotente, se for a
segunda, Ele não é bondoso. Como o senhor entende isto?
Tom: Realmente essa pergunta é beeeeeem antiga. Agostinho
bem antes de mim já refletia sobre isto, porém ele não conseguiu explicar, aquiescendo-se
na fé. Eu, entretanto, acho que consegui avançar neste tema. Acredito que o que
aconteceu com Lúcifer também explica os outros eventos: Lúcifer não nasceu mal,
ele se tornou mal por conta de uma falha, assim como acontece com as doenças
que ocorrem quando o nosso corpo falha na tentativa de nos proteger.
P: Como ocorre no câncer, em que as próprias células
passam a se reproduzir de forma não controlada gerando tumores?
Figura 2Células
de câncer no pulmão
Tom: Não conheço o câncer, mas sim, seria nesse sentido
de que as coisas falham e através das falhas o mal é gerado. Pense por exemplo
na morte, que realmente é algo tido como muito ruim, mas sem ela a cadeia
alimentar não existiria e como dariam-se as outras vidas?
A: Mas então o senhor acredita que a morte é um bem?
Não me leve a mal, mas não é algo que se possa aceitar tão facilmente... Quer
dizer então, por exemplo, que as mortes ocorridas na Segunda Guerra Mundial têm
um motivo? Que pessoas como Anne Frank morreram por um bem? Não consigo ver o
motivo.
Figura 3Fragmento
do livro O diário de Anne Frank
Tom:Creio que o mal é uma falha e que existe um motivo
maior para cada parte desse mal, mas não sei todos os desígnios de Deus. Não
posso te responder sobre todas as explicações para todos os atos que ocorrem...
Nessa parte me pareço com Agostinho e me seguro em minha fé.
P: Sabe, isso me faz lembrar do livro Silmallion.
Nele, Tolkien explica a criação do mundo através de uma música cantada por
Illuvatar (senhor do tempo e de tudo que há) e os Valar (filhos de Illuvatar). A
música era harmoniosa e sonora até que um dos Valar começa a querer destacar-se
e, para contê-lo, vários outros passam a cantar mais alto. No final, Illuvatar
diz que se não fosse a desarmonia, a música não teria sido cantada com tanta
vontade. De maneira que a desarmonia possibilitou a música tornar-se melhor.
(Link para download: http://www.4shared.com/get/TLquWzMi/o_silmarillion_.html , disponível em 14 de junho de 2015.)
(Link para leitura online: http://cabana-on.com/Ler/wp-content/uploads/2013/06/J.R.R.-Tolkien-O-Silmarillion.pdf ,disponível em 14 de junho de 2015.)
Tom: Bom, seria algo assim. Os filhos desse senhor não
sabiam que a música ficaria melhor, mas ela ficou... Estava nos desígnios.
P: É assim também nessa mesma história que Melkor, um
dos Valar, por inveja destrói as árvores do palácio. Porém, depois disso, a
seiva dessas plantas torna-se sol e lua.
Figura 4
A criação de “Valinor” e das “Árvores de Valinor”
Tom: Essa história parece ser bem profunda, mas a ideia
é bem essa. De certa forma acredito que o mundo precisa ter essas falhas para
evoluirmos, só não sei como.
P: Parece também com a história Paraíso
de Jorge Furtado narrada no livro "Meu tio matou um cara". Conta a história de
Beth que morre e, encontra no céu, o mundo mais que perfeito. O café era
perfeito, não havia canais do boi, nem comerciais muito longos, no jornal todas
as notícias eram empolgantes e alegres, o marido dela era um galã da globo que
a amava incondicionalmente. Depois de algum tempo ela pede para falar com São
Pedro, e sem burocracia ou espera, ele aparece. Beth pede então a ele para que
faça falhas no dia dela, que o café saía meio amargo às vezes, que o leite
derrame, e que o marido as vezes a traia. São Pedro fica espantado, e ela
explica que precisa dessas falhas para se motivar a continuar seus dias, que
não tem graça acordar e não ter o que fazer, problemas para resolver.
Tom: Não vou comentar sobre a história do céu, mas
entendi a questão e realmente é bem isso. Exceto a parte do agir diante de um
mundo perfeito.
A: Sabe outra coisa que sempre me deixa encucada? É
essa história de livre-arbítrio... se tenho livre arbítrio por que não posso
voar?
Tom: kkkkkkkkk, tenho impressão que independente das eras
os homens continuam querendo voar! Entretanto, veja que retomamos àquela
questão de não saber todos os desígnios de Deus, pois ele nos deu um corpo
limitado. Provavelmente para nos incentivar a criar coisas que nos ajudassem em
nossas limitações, mas isso não retira nosso livre-arbítrio. Além do mais, não
voar é uma limitação que pelo que ouvi falar vocês já conseguiram superar.
A: Tá bem, tá bem... Acho que podemos viver com isso.
P: E, realmente! Já chegamos à lua: foi muito louco!
A: Mas Tom, outra coisa! Tem uma série
incrível chamada Criminal Minds (Mentes Criminosas, na tradução brasileira).
P: A parte da série incrível fica por
responsabilidade dela... (rsrs)
A: Nem vou te escutar Phagner, enfim
nela se retrata um caso em que três melhores amigas são mantidas em cárcere por
seu sequestrador até que elas matem uma entre elas. E, assim as meninas vão
unindo-se uma contra a outra decidindo quem deve morrer ou não. E tem também
aquela situação que rolou no acidente aéreo nos Andes. Painho ainda era menino,
mas eu sei que quando o avião caiu as pessoas sobreviveram alimentando-se dos
que já haviam morrido. Daí essas escolhas como maneira de sobrevivência consistem
em livre arbítrio?
Tom: Eita! Para isso eu não tenho resposta, o mundo é
outro agora...
A: Hum.... Agora me veio uma outra pergunta: tem como
evitarmos certas falhas? Tipo tem como sermos melhores?
Tom: Claro que tem! Aristóteles já falava sobre isso: a
virtude humana pode ser aprendida e ensinada. Se todos buscassem a
benevolência, buscassem a Deus e seguissem os desígnios que Ele nos deu
claramente, conseguiríamos evitar muitas falhas.
A: Tô ligada!
P: Bom, acho que é isso.
A: Tom, o senhor poderia encerrar a entrevista com uma
mensagem para nossos leitores?
Tom: Dê-me, Senhor, agudeza para entender, capacidade
para reter, método e faculdade para aprender, sutileza para interpretar, graça
e abundância para falar, acerto ao começar, direção ao progredir e perfeição ao
concluir.
P: Obrigado, Tom! Foi um prazer partilhar do seu
conhecimento!
A: Boa noite e até a próxima edição do Conversando com
os filósofos!
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